Roberto Gamito
10.03.21
É preciso respirar fundo e saltitar qual pardalinho despreocupado antes de ingressarmos na crónica. Prefiro pardalinho a pardal porque, ao proferi-lo, parece que estou a ouvir um pardal a esvoaçar.
A fim de evitar as fornicações da vida, as quais nos emboscam a cada esquina como se fôssemos a sua putinha, a fim de reprimir o nosso desnorte, e não subamos na hierarquia da loucura, é útil esboçar um sorriso que se eleve ao estatuto de pintura. Caso contrário estamos tramados. Não basta frequentar as casinhas onde são tecidas as patranhas. Não, nós devemos, no pino da ousadia, frequentar o suspiro de Deus de modo a perceber o que se acoita no estaleiro da luz. Em todo o caso, a cabeça do Homem é povoada de venenos. A solução é, tal como um monge faria neste caso, vigiar cada pensamento e usar roupas frescas de molde a arejar o penduricalho. Caso haja a possibilidade de procurar a iluminação a dois, que é como quem diz, enroscados simpaticamente enquanto nos despedimos de sentenças barrocas e nos agarramos aos sons animalescos, devemos laborar no sentido da salvação mútua.
Em correndo bem, supondo que há essa possibilidade, o sexo, se imbuído naquela atmosfera de perfumes que os poetas designam amor, é isso mesmo: laborar no sentido da salvação mútua. Terá escapado aos exegetas da luz esta interpretação, daí o desaconselhamento da fodanga. Preferiram, em vez disso, aconselhar a virgindade, elevando-a a patamar sacro e postular algo como: o virgem é o que há de mais parecido com Deus. Dito de outro modo, só na virgindade o Homem é parecido a Deus. Ao olhar superficialmente para o coito e ao conspurcarem-no com interditos, foram incapazes de ver o oceano de benefícios que a fornicação pode trazer ao animal vertical.
Mas de quem é a culpa? Primeiro que tudo, é preciso dizer que a traição pode ser entendida como vontade divina: uma necessidade incontrolável de nos perpetuarmos que impele os Homens a procriarem. Daí que, descoberta a traição, muita vezes não encontremos justificação. Aconteceu porque Deus assim o quis.
Também seria ingénuo dá minha parte patrocinar as palavras de Santo Agostinho a respeito de Eva. Depois, para o ajudar, criou a mulher. Não quero ser o arauto que vem estragar a festa da patranha, mas seria ajuizado se vos comunicasse que estamos diante de um abuso de linguagem. É mais complicar. A mulher complica. E isso não é bom nem mau, é o que é. A relação é a possibilidade de nos transcendermos. Se fosse uma ajuda sem atrito dificilmente cresceríamos. Bem, mas o que nos trouxe cá foi a Eva, essa sacana primeva.
Antes da queda não havia nascimento. Ora temos de agradecer à Eva, e à sacanice da cobra, o part-time de Lilith, primeira mulher de Adão, o facto de fornicarmos. Todavia com a fornicação veio também a morte. Lembrem-se: se não fosse a morte não fodiam; ambas estão ligadas e a Eva é responsável pelas duas.
Putéfia, pensam vocês precipitadamente. Peço-vos que ginastiquem o miolo a fim de receber com simpatia as próximas palavras. O que preferem? Ser imortais e nunca esfarelar o nabo ou dedilhar o marisco ou fazer isso tudo e mais algumas coisas obscenas lindas de se ver e bater as botas quando menos se espera? Acho que fomos agraciados com uma bela escolha. O sexo, quanto a mim, é superior à imortalidade. A Eva escolheu bem. Obrigado, Eva. O exemplo máximo da expressão: não há bela sem senão.
Porém, o assunto não fica encerrado, ainda temos Deus na equação. Deus, se quisesse, poderia, após a queda, fazer com que o casal procriasse sem relação sexual. Todavia optou pelo coito.
Aproveitemos para repescar a comparação de há pouco: Deus é semelhante ao virgem. Quem me diz a mim que Deus, omnipotente e cheio de ardis, embora virgem, não instalou órgãos genitais em Adão e Eva, incitando-os à marotice, porque queria ver algo que o animasse, farto que estava de ver flores e abelhas? Se sim, podemos estar diante do primeiro realizador de filmes pornográficos. E sim, a virgindade de Deus também explica a cólera do Antigo Testamento: tinha os colhões cheios.
Olhem-me o maroto-mor.