Roberto Gamito
16.02.22
O movimento deixou de ser o objectivo; em vez disso fortaleceram-se as estratégias de propagandear o futuro movimento. O homem-estátua grita que um dia será maratonista.
Ninguém é imune ao grito. A primeira palavra após o bramido é decisiva: é teatro ou não é teatro? Há na espera uma delicadeza raramente elogiada. Por que espera aquele que podia estar em qualquer parte do mundo?
O mundo escondeu os seus podres, diz uma hiena a outra. Já não pertencemos a este século, prossegue o necrófago. Aquilo que era efémero porque humano foi banido e agora é quadro de museu.
Antes de o mundo ser mundo — estranho e povoado de possibilidades —, talvez houvesse apenas uma palavra dentro da qual se acoitava o infinito. Sentimos falta dessa arrumação.
Uma vida a endireitar demónios é cansativo, diz o paciente ao psicanalista. A cabeça do homem contemporâneo é um congresso de demónios ilustres, comentou o psicanalista, isto é, rebentos do eu.
A estupidez é um diplomata sem talento: a sua tentativa de aproximar dois povos sai gorada.
O início e o final são duas formas distintas de pronunciar nada.
Neste panorama pouco animador, talvez o pior seja a constatação de que os bolos fazem as vezes dos messias. O bolo salvar-nos-á?, pergunta a velha ao padre. Não fale de boca cheia, riposta o pastor-fabulista à ovelha do seu rebanho.