Roberto Gamito
18.01.21
A vantagem de escrever um texto sobre as razões que me levam a achar que sou estúpido — concedo, tema mil vezes adiado, mas de hoje não passa — é a de não ter de me dar ao trabalho de explicar os pontos como se fosse uma investigação filosófica. Mal me abalanço para vos comunicar a minha estupidez, já vocês a receberam como verdade absoluta. Assim dá gosto. É curioso perceber que, no tocante a este capítulo, a nossa ligação é perfeita, digna de uma relação burilada pela paixão. Assim que acabo de pronunciar “Sou es…”, vocês, leitores ávidos de participar quando é chegada a altura de apoucar o escrevinhador, concluem sem enguiço “és estúpido, sim, nós sabíamos”. Embora a franqueza sem indício de hesitação me magoe, uma coisa é eu dizer que sou estúpido, outra é ser reconhecido como estúpido por uma multidão de desconhecidos — é assim que as refregas de tasca começam —, reconheço que o que conquistámos, a capacidade de ler a cabeça do outro, deve ser preservada a todo o custo.
Não obstante a estupidez me caracterizar abundantemente, sou inteligente nas horas em que ninguém nota e em labutas que ninguém passa cartão. E vocês dir-me-ão: “Mas será isso ser inteligente, Roberto?” Não vos consigo responder, neste momento estou na minha fase estúpida. Fora de brincadeiras. Já tive a oportunidade de assistir a episódios estúpidos, discursos estúpidos, atitudes estúpidas, pelo que, estúpido como sou, bebi inspiração em todos essas, digamos, disciplinas. A única coisa que peço é que respeitem a minha estupidez. Se não vos fizer confusão, consintam que eu filosofe pacatamente sobre o destino do Homem numa mesa de café. Não vos peço mais nada. Quero ter condições para me dedicar à tarefa de não dizer nada com nada.
Estamos entendidos? Óptimo, a próxima pagam vocês.