Roberto Gamito
03.02.21
A turba faminta admoesta-o, centrando a censura na hipocrisia. Todavia, esta necessidade de apontar o dedo, ao invés de quebrar o ciclo, reforça-o. Qual personagem de Plauto, somos criaturas bacorejando "este homem está perdido!" enquanto ocultamos a nossa miséria interior.
Estamos mortos! Finalmente uma boa notícia. Escandalizados com o inferno, puxamos fogo a tudo o que mexe, santo ou demónio, eis a era dos critérios fluídos, termo caro a Zygmunt Bauman. Condenamos sem hesitar e passamos sem demoras nem ensaios ao engano perpetrado pelo sevandija.
Uma ideia nova?! Caramba! Fiz uma aquisição pouco desejável para a minha idade, dir-me-ão. Com efeito, já sou suficientemente crescido para ouvir conselhos de sacerdotisas ou astros. Estima-se que a maior parte se perdeu. Livro (um livro simples, não o de Mallarmé) ou vida.
A constatação dolorosa de que as partes líricas não auferem um entusiasmo semelhante à reputação dos papagaios vigentes. Pus as musas e os daimons para trás das costas. Por Hércules, não tenho medo, nem suplico inspiração a ninguém, enquanto tiver mão e fome não me vergarei diante de ninguém. Exegeta: Possivelmente, animal vertical.
Sósias e mancos, parvos e parlapatões, uns e outros obstaculizam o homem que aprende a voar onde a noite é mais cerrada, que gemem a cada fanfarronada, que obliteram onde os outros são funâmbulos.
A língua, a sua divisão em episódios e estásimos, em odes e elegias. Mas o que é a arte senão o ritual de transformar o Homem no seu próprio arúspice, esse inacabado exercício de ler as entranhas.