Roberto Gamito
13.11.22
Filho de dois homens imaginários, condição que o livrava dos vieses dos artistas contemporâneos, perdia as tardes a esgaravatar no mármore à procura do rosto do homem. Adulterando a frase de Borges, bradava a quem quisesse ouvir: o ser humano vive da ficção que todos os dias acontece algo diferente.
Numa ocasião forense atípica durante a qual vacilava no cadáver de um anjo caído, um desumano exercício de restauração, gania afinado: hei-de ressuscitar o mal nem que seja a última coisa que faça.
De um lado Fernando Pessoa e a sua tanga: "eu sou uma antologia", do outro, o anónimo: "em calhando, serei uma nota de rodapé".
Um dia chegaremos à conclusão que a arte não é senão um complexo, tortuoso e labiríntico manual de tortura com vista a esfrangalhar o projecto das inúmeras levas de Narcisos.
Também não é preciso abrir as asas, a ficção de gigantismo não afasta a fome fulminante do predador alado. O tom deste século é o de uma velha solteirona que deixou a vida escapar-se-lhe entre os dedos.
Ser anónimo, actualmente, é experimentar a coreografia do neutrino: não interagir com nada nem com ninguém. Eis a pureza que ninguém esperava.
Agrilhoado a uma cona esfomeada, qual Prometeu que ignorava tudo sobre o fogo. Ao longe, as águias de Zeus parecem corvos e abutres. Mas alegrem-se, tenho uma boa notícia para vos dar: vi um homem vergado sob o peso do seu conhecimento. Que aldrabão!
Salvem as cartolinas e o mundo que se foda. Assim se esgotam as alternativas. Coragem! Confiem nos vossos instintos, sejam vocês mesmos, amanhã o trend poderá ser outro.
Afectivamente falando, considero-me canibal. Estão cá dentro.
O importante não é achar o amor, é não parar de o procurar em todas as casas.
A vida adulta é o suicídio colectivo das perguntas. É abanar a cabeça para evitar problemas. É cada vez mais difícil fazer destrinça entre um resignado e um doente de Parkinson.
O aplauso serve tão-somente para ocultar o barulho do disparo. Lindo, o artista despediu-se com um sorriso nos lábios.
Curei-me da depressão, já não vou ao fundo. Sou o homem de cortiça. O poder terapêutico da parvoíce.
O humorista é pródigo em três coisas: disparates, choradinhos e regras dos três.
A minha mediocridade nunca cessa de me espantar: adapta-se a tudo o que faço. Isso há-de ter algum valor.
Nova profissão: porteiro de redes sociais. Alguém cuja incumbência é controlar as saídas e as entradas deste teatro de doidos.
Se Kafka tivesse nascido em Portugal, teria sido apenas um tipo com orelhas grandes. E isso só revela a escassez actual de capachos monumentais.
O artista sobe a palco e berra: não tenho nada interessante para vos contar. Bem, vamos à minha vida. Para o que havíamos de estar guardados.
Na sociedade do espectáculo vertiginoso, não confundir com a do Guy Debord, a arte não é uma arma, é uma faca de plástico de cor garrida.
Agradeço ao twitter por ter acabado com o mito do artista inspirado. Parece que ouço o meu avô, não tens nada nos cornos.
Mais uma errata. Porra, Fernando Pessoa, não acertas uma.
Só a arte é inútil.
Tenho três cães e mil fantasmas, sonhos esmagados e coração desfeito e pouca paciência para rodriguinhos. Há três coisas infinitas: o universo, a estupidez humana e as versões desta frase de Einstein.
Isto é tudo muito bonito, empatia, privilégio e os demais vocábulos de papagaio mas o que é certo é que basta uma noite mal dormida para o diplomata pôr a sua carreira em risco. E quem diz carreira diz pescoço.
Está bem, Confúcio, é melhor acender uma vela do que amaldiçoar a escuridão, mas porra, um gajo desfeito tem de se entreter com alguma coisa.
Oxímoro: modesta opinião. Se é opinião não pode ser modesta. Estamos conversados.
Não vou na cantiga dos artistas genuínos, só acredito quando vejo um homem esmagado pela vida. O resto é performance. Não me bombardeiem as vistas com teatros medíocres.
Se o humor desaparecer, a gigante começará a temer o anão.
Adie tudo, a menos que seja uma discussão. Evite ofuscar os medíocres, preferencialmente se não estiver disposto a levar no focinho.
Será que é mesmo necessário? Eis a minha resposta universal às ordens que me lançam.
Isto está uma merda, dir-me-ão. Já estava assim quando eu cheguei, eis uma das poucas frases que nunca poderá ser dita por Deus.