Roberto Gamito
23.03.21
O encontrão com o vulto, a noite na lama. Fossam garimpeiros e porcos onde ontem havia ouro. O receio tornou-se maiúsculo como uma ficção apocalíptica, as pérolas debandaram como um bando enorme de flamingos. As sobras de crustáceos nómadas respirando de alívio enchem o charco de bolhinhas. Gigantes de faz de conta, critérios flutuantes celebram qualquer ninharia. A argila que ora toma a forma de triunfo, ora de falhanço. O eco em vias de morrer acudido por uma equipa de papagaios paramédicos ganha, infelizmente, uma nova vida. O precipício saindo do papel rumo a um mundo fértil em quedas. A repetição, o nexo entre o regresso e o desespero posto numa cantiga de entediar canários.
Um urso com o preço de uma lebre empalhada. O gerente da loja de obscenidades enganou-se na etiqueta, errou no animal, errou no valor, errou na sua vida. Avancei, precavi-me a ponto de não tentar dar nenhum passo certeiro que pudesse mudar a minha vida substancialmente.
Eis o engodo destinado ao leitor: tesão que separa o trigo do joio. Meu senhor, quer que o enrabe já?, pergunta o vendedor sem máscara ao cliente. O biltre da autenticidade macaqueava a pergunta do vendedor, porém incapaz de a pronunciar até ao fim.