Roberto Gamito
29.11.20
Enquanto a tristeza e a depressão, sua irmã mais velha, nos afunilam, nos diminuem, nos agrilhoam, o entusiasmo e a paixão tentam melhorar-nos e criar versões mais aperfeiçoadas de nós mesmos. Doravante sentimo-nos capazes de enfrentar novos desafios com um sorriso nos lábios. Ou nos esfalfamos para concretizar aquilo que o lume nos sussurra ou tornamo-nos, mais cedo que tarde, mestres na arte de encolher os ombros.
A mão, palco de todas as intensidades, é uma figura ora paciente e bondosa, ora selvagem e vulcânica. No papel, é uma frágil ponte de entendimento com aquilo que borbulha por ora sem forma nas nossas mentes.
É sempre a mesma cantiga. Ou estamos no cerco ou estamos a empreender uma jornada. E aqui chegamos a Homero. Só há dois caminhos: o combate ou a fuga: eis-nos chegados a Canetti. Como o leitor mais sagaz terá notado, são duas formulações da mesma ideia. Encontramo-la até, curiosamente, no âmbito das meditações.
Enquanto na meditação oriental nos esforçamos por limpar a consciência da sua miscelânea de ansiedades, mágoas e entusiasmos, isto é, lumes de várias proveniências, concentrando-nos no presente mais imediato, prestando especial atenção a todos os movimentos — até aos mais pequenos, como o acto de respirar. Sem querer alcançamos uma ideia cara a Hermann Broch, tudo muda numa mudança de respiração.
Essa meditação é a demanda pela serenidade e libertação, apaziguando o fandango das nossas — termo budista — “mentes de macaco”.
Do outro lado do espectro, temos a meditação ocidental ou, se quiserem, meditação filosófica. Esta divisão dá-nos um lamiré sobre a grande diferença entre o pensamento oriental e o pensamento ocidental. Eis-nos chegados à mesma ideia de sempre: ou foges ou combates.
Na meditação filosófica, em vez de sermos encorajados a evitar esse mar de preocupações e ambições, é-nos aconselhado que dediquemos tempo a resolvê-las, averiguá-las e confrontá-las. Em suma, pôr a mão nesse mar de nós com a intenção paciente de os desfazer. Esta forma aproxima-se muito da psicoterapia, embora tenhamos de assumir dois papéis: o paciente e o terapeuta.
Bem feitas as contas, o Homem é o somatório de fugas e combates.
Não podemos lutar sempre, nem podemos fugir sempre. É necessário intuir as lutas que necessitamos de travar.