Roberto Gamito
27.12.20
Coração, morada das mais obsoletas tangas. Sem pinga de receio, o homem imaculadamente bêbado profetiza a rixa que há-de vassourar mesas e cadeiras da esplanada, dispondo-as como que artisticamente no passeio. A conversa cresce em mal-entendidos. Na orla da futura escaramuça, homem e mulher negoceiam intenções quanto à guerra que se irá travar logo à noite numa província isolada.
O velho, que por vezes sobrevive às transações entre a luz e a sombra, chamava o polícia de Zé da Boina.
Alfabetiza-se a carne quando a palavra é aquecida pelo lume do tesão. Procurar o gemido mais eufónico de modo a afinar o coração.
Quando pequeno, entrava no mar para escaramuçar com o oceano. Mergulhava de cansaço minutos depois, como se ensaiasse a sua própria morte.
Animais sem nome de apetite ecléctico. Uma frase antiga roída da crítica. Compete-nos pôr cobro aos incómodos, suavizá-los numa prosa de enamorado, não denegrir cumes nem enaltecer sopés, linguarejar com uma postura de quem veio para ficar.
Homem magnificado pela paixão, logo bestificado pela separação. No delta da apoquentação, poesia, suicídios e uma maré de hieróglifos.
O Homem despenha-se na sua própria vida, uma queda aperfeiçoada dia após dia, não devendo nada ao falcão.