Roberto Gamito
20.03.16
O domingo é um posto alfandegário, o qual, é importante dizê-lo, marca uma grotesca transição. É a fronteira entre a galhofa produtiva e o trabalho entediante mas essencial. Há que ver o lado positivo: urge ganhar algum para continuar a levar esta vida miserável. É o agrimensor carrancudo que separa o passado do porvir. As bordas de um precipício que se avizinha: a semana; um sujeito em vias de se despenhar. Posiciona-se entre o melhor e o pior da semana. Aquele gostinho a sábado e aquele cheirinho a segunda-feira fazem dele uma mistura explosiva, é necessária uma certa cautela.
Acordar depois das três da tarde, como é sabido, dá multa e, se por acaso tens afoiteza de campeão para acordar cedo ao domingo, não deves, sejam quais foram as circunstâncias, alardear o conseguimento sob pena de seres ostracizado pela sociedade. O domingo é o dia, de entre todos os que temos à nossa disposição, em que fortalecemos os laços com a nossa cama. É amor. Há tempo para silêncios de todo o tipo. É cair na realidade. É confeccionar os preparativos para ingressar neste mundo que nos há-de comer um dia, o mais tardar amanhã.
Manta sobre os presuntos é dress-code, chá na manápula e quase que arriscaria a dizer que estamos perante um quadro de uma pessoa feliz. É ao domingo que negociamos connosco próprios mais uma semana de coisa nenhuma, sucessivos projectos que desaguam em desertos e tal. Há quem diga que o domingo é um dia propício ao suicídio. Não duvido, o mundo não está para brincadeiras. Bom, é meio-dia, vou voltar para a cama.