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Fino Recorte

Havia uma frase catita mas que, por razões de força maior, não pôde comparecer. Faz de conta que isto é um blog de comédia.

Fino Recorte

Havia uma frase catita mas que, por razões de força maior, não pôde comparecer. Faz de conta que isto é um blog de comédia.


Roberto Gamito

23.08.21

A felicidade não põe comida na mesa. A diversão não põe comida na mesa. Os passatempos não põem comida na mesa. Em breve nem o trabalho porá comida na mesa, disse a empregada de mesa.  

Escrever quando se está apaixonado devia ser considerado batota. Basta olhar para a amada e o resto escreve-se sozinho. Espero que criminalizem esses pulhas enamorados o quanto antes.

Guerras por todo o lado, miséria ao pontapé, pessoas no chão, deuses escaqueirados por marretinhas; o grito como língua oficial do século. O bêbedo pensa para si: "já tive ressacas piores". 

Vamos acabar, disse a mulher. Calma, é tudo muito pouco razoável, tudo muito definitivo. Não estás aberta a negociações?, ripostou o homem. Vamos dar uso à tua veia diplomática, querida. Não, soletrou impecavelmente a mulher.

As Primaveras são mais curtas onde pululam namorados. Fujam desses pardieiros se não quiserem morrer novos.

O velho, gasto como um instrumento musical abandonado, repete sempre a mesma deixa. Toques no tema que tocares, sai sempre a mesma nota. Uma nota das gordas para pagar os serviços à puta.

Sexo a rodos, banquetes opulentos e serviços públicos sem falhas, comentou o homem ao anjo caído. Por que motivo regressaste, questionou o anjo. Aquilo não era para mim, sou muito conservador, e além disso adoro reclamar quando estou nas filas.

Enfiei com ganas aquilo que tinha a fim de inventar mais uns centímetros ao pau. Pela cara dela, acho que não surtiu efeito.

Pensamento? Se calhar, o melhor era matarmo-nos a todos e tirar isso da cabeça.

Mulher avassaladora na cama. O escritor não voltou a escrever desde que a começou a comer. Segundo se conta, ela suga-lhe a vida pela verga. Abençoada fodilhona, o mundo está pejado de obras medíocres. 

A mulher era demoníaca na cama. Quando se vinha, o homem fazia o sinal da cruz.

Progresso? O mais certo é tirarem-nos os brinquedos e mandarem-nos para casa de barriga infeliz.  

Armindo foi preso por praticar preços criminosos numa mercearia biológica. Havia quem, pressionado a levar uma vida saudável, comprasse repolhos a prestações. 

O humorista fez uma piada e a suas palavras tiveram efeito no mundo real. Então não é um mágico, é um feiticeiro. Seja como for, fogueira com ele.

Não tomo a vacina porque ouvi dizer que houve uma pessoa que bateu as botas ao tomá-la. Meu amigo, se alguém morrer enquanto dá uma berlaitada, será que também vai deixar de fornicar? 

A crónica não põe comida na mesa

 


Roberto Gamito

21.06.21

Todos os desfechos das hecatombes são covers do silêncio primevo. Penso em rituais de engrandecimento do ego e rituais de esmagamento do ego.

Como é que se chega à perfeição sem fazer batota? Qual dos atalhos devo adoptar para o meu caminho? Um homem com pernas suplentes como os mongóis tinham cavalos. Parar é morrer.

A pandemia enquanto parteira de novos microcosmos. Milhares de homens armados em planetas em miniatura orbitam com afã à volta de casa. Os astros despenham-se sem pedir licença. Os profetas vêem-se esmagados no seio de uma destruição ininterrupta, tornaram-se obsoletos. A profecia ruinosa é lenta de mais para um século como o nosso.

O lado fascinante da palavra: exibe e oculta. Por vezes em simultâneo. A palavra nua para uns, enfarpelada até aos olhos, para outros. Sedução caleidoscópica?
Uma síntese: motivos para prosseguir:
(preencher quando houver certezas.)

Sair da folha para fugir de quem está na escrita. Criador ultrapassado pela criação uma e outra vez.

A dor entra com força a meio do poema, destroçando pássaros e orquídeas. Com as sobras nas mãos, perfumes e penas, exigem-nos um novo mundo.

Há um espaço invisível em redor das obras de arte que impede o homem de ser engolido por elas. Mas o temor ninguém nos tira.

De dia contrói uma ponte, à noite, um muro. Eis o Homem.

Os poemas escritos durante o arco da humanidade não chegam para homenagear as aves extintas. Ainda há muito para voar.

O morto é aquele que já não pode ser contagiado pela arte. A queda tem-me na mão. Uma expressão síntese para a vida: reunião de trabalhos.

Imaginar a possibilidade de empacotar o universo num verso. E amarrotá-lo.

Os números com o tempo metamorfosear-se-ão em linhas e as linhas em paisagem e tudo isso será engolido com a subida das águas.

Olhos vendados, mão vendada, pés vendados. O artista que não sabe para onde vai.

Após uma década de gatafunhos, a mão começa a desafiar a queda.

Não podemos interferir no precipício do Homem, só podemos assistir ao seu desenrolar.

Frase com um funil na cabeça, para não se morder a si própria.
Porém a ferida persiste.

Um louco pergunta ao outro compincha de hospício: Se perdesses a cabeça, ias procurá-la?

A única coisa que nos faz continuar é a sede. Perdidos ou não, não interessa: não temos outro lugar para onde ir.
Só com a cabeça de fora das areias movediças, o poeta burila a epopeia. É um teste que o deserto põe ao homem de molde a ver até onde está disposto a ir aquando da sua perdição.

Tu ontem não confiaste na minha escrita, na minha respiração. O que mudou entretanto?

Amanhã por sorte não é já.

Funil na cabeça da frase, Roberto Gamito

 

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