Roberto Gamito
21.02.21
Larachas, abundantes noutras épocas, essa requintada comicidade que rapidamente resvala com gosto para a boçalidade, essas palavras que se encontram sem tino na frase a fim de apimentar uma vida monótona, momentos em que falsamente nos conjecturamos superiores face aos obstáculos do mundo, o qual continua a maravilhar-nos de longe em longe. Clandestinamente, forjei que tinha dado à luz uma piada capaz de ressuscitar moribundos de supetão. Acabo de te apanhar em descarada mentira, ó bandido, pensa o leitor.
Mas tratemos do assunto que nos trouxe cá. Quantas birras há aí motivadas pela carência de afagos e carícias de natureza mais íntima? Em todo o caso, a comédia e a tragédia acenam-nos continuamente, ao longe e à vez, como se nos conhecessem melhor que ninguém. E eis a piada, vinda sabe-se lá de que recanto da mente, proporcionada por um salsifré de pensamentos, palavras e pontas soltas, desagrilhoando-se do inconsciente e pedindo de empréstimo a nossa voz. Num ápice, o outrora sólido é liquefeito pela comédia. A magia caseira da subversão. Em termos de ganhos efectivos, refiro-me à piada beliscar a realidade, sabemos que vai um longo e sinuoso itinerário. Findo o efémero império do solavanco proporcionado pela piada, o mundo regressa ao que sempre foi. Por mais que gastemos energia a tentar perceber a fragilidade de uma piada, que, ao separar-se da surpresa, cambaleia num bailarico de falsos reacendimentos até à extinção, esta continuará arredia à ideia de imortalidade.