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Fino Recorte

Havia uma frase catita mas que, por razões de força maior, não pôde comparecer. Faz de conta que isto é um blog de comédia.

Fino Recorte

Havia uma frase catita mas que, por razões de força maior, não pôde comparecer. Faz de conta que isto é um blog de comédia.


Roberto Gamito

23.04.21

Exagero na prosa? Acaso te referes ao alferes nos halteres? O taco taco a taco com o cassetete. Lince, tigre, homem inteligente, isto é, animais a caminhar sem medo para a extinção. O escritor avesso à depuração; no poial da década, o ruído a superá-lo dando às perninhas. Mão, versátil instrumento de captura. A interpretação rude da fuga. Munido com a inspiração, o vate do século repete sem maestria o papagaio, trocando as voltas à cotovia. Quem matou o canto desta vez? Fracasso num tríptico soluçar. Rosácea novelesca logo comentada. Prolifera a legenda. O silêncio faz-se sempre acompanhar de muletas inúteis. Na fronteira da província da metalucidez, os moços de recados eram ensinados a cuspir sem ganas nas convenções. Uma catanada nos gatafunhos: eis o bálsamo — outro embuste. Ao relento, lentos relatos sobre os regatos outrora povoados de histórias. Frases humanizadas graças à repetição, frases miseráveis todas sangue, suor e desgraça. O desequilíbrio padronizado segundo a época e a moda. Onde posso eu pousar este verbo em brasa? Corpo estacado na cadeira, mão migratória, uma mancha de texto qual bando de estorninhos. Mais um degrau aéreo na abstração. Alimento-me de ventos e labirintos. Um suspiro de perna curta, de pronto apanhado na curva pela garra predadora. Afobados, furibundos, de entaramelada convicção, as criaturas em farrapos. Os pintores vomitam face a tão sinistro retrato.
Mescla domingueira, engalanada para posar sem ousar. O Homem está morto. Anuímos em uníssono e prosseguimos sem soluços o banquete opulento. O pelintra versado no engano — perdoem-me, este é de outro quadro, não pertence aqui, é um estrangeiro à procura de oportunidades. Já está, já está. A vida? Não está, não está. Trabalhemos com o que temos.

A tempestade na língua não cai do céu.

 

Mão migratória, Roberto Gamito

 


Roberto Gamito

22.01.21

O cambiante erótico desagrilhoa a fera, enaltece o Homem no reduto onde as palavras se evaporam e se precipitam como gemidos. O problema não resulta da sublimação da legenda. O quadro, o qual oscila entre o império do pó e o império do olhar, permanece ilegível. Num ápice, o retrato animaliza-se, acoita-se atrás da paisagem pintada virtuosamente pela fome, pela sede, pela mão do pintor. Suspiro, oráculo sucinto. Narrativa, a cantiga prolixa de um queixume mais ou menos sub-reptício. Alcanço a orla do precipício com a cabeça vazia. Nisto, saboreio a altura de olhos fechados. O perigo não resulta desse pensamento. A tautologia da expressão “pensamento crítico”. Adultero a queda graças à memória. Em acontecendo, o grito despertaria um a um os demónios.

Convenção começando na língua e acabando na carne. Um certo indivíduo, cujo nome ninguém recordará, compara alturas de cadáveres mitificados pelos livros. Silhuetas povoando as paredes. A mão sorteando a forma. A pupila procurando o nome na sombra.

 

Mão sorteia a forma, Roberto Gamito

 

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