Roberto Gamito
29.06.21
Mão: Acorda, dorminhoco, o teu trabalho está por confeccionar.
Há dias, estava eu vencido no topo de uma pirâmide de cadáveres liquidados pelas emendas, uma vozinha veio ter comigo e disse-me: “Quando um homem tem este tipo de animais a habitar-lhe a cabeça é um perfeito disparate tentar escapar-lhe”. Não se volta a repetir, comuniquei-lhe.
O meu nome espalhou-se pelos quatro cantos do mundo e hoje toda a gente se chama Palhaço. Tenho (e por esse dom me congratulo com intermitente gratidão) a capacidade de dividir o mar de lérias em dois. Moisés da intrujice guiando as sinapses rumo à Terra Prometida.
O besugo deixara-me embasbacado; nunca me passara pela cabeça que o peixe tomasse a liberdade de me dirigir a palavra.
Não devemos julgar os palhaços de forma gratuita ou apressada.
Há palhaços relativos e indiscutíveis.
Quando falo de indiscutíveis, refiro-me a palhaços que são palhaços em qualquer cenário, nos bastidores e no palco, na companhia de quem quer que seja, online ou offline, de manhã à noite, do berço até à cova, da embriaguez até à sobriedade e vice-versa, calados ou de língua prolixa, de pé ou de cócoras, cândidos ou de quatro, com ou sem maquilhagem. Os relativos, como está bem de ver, são palhaços em determinadas situações da vida e em determinados contextos. Em suma, são palhaços quando lhes convém. Palhaços interesseiros ou palhaços por vocação: eis as duas tribos.