Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Fino Recorte

Havia uma frase catita mas que, por razões de força maior, não pôde comparecer. Faz de conta que isto é um blog de comédia.

Fino Recorte

Havia uma frase catita mas que, por razões de força maior, não pôde comparecer. Faz de conta que isto é um blog de comédia.


Roberto Gamito

09.03.23


Esta crónica humilde é dedicada ao Roberto Gamito, sem o qual seria praticamente impossível garatujar uma prosa de qualidade tão duvidosa.

Em tempos recuados, mas não tão recuados assim, uma vez que ainda faltam queimar alguns cartuchos e andam por aí pilas matreiramente cansadas à procura de jazigo, orgulhava-me de ser detentor dos mais baixos índices de eficácia no tocante à captura de grelo. Justificava-me que trocara a cona letrada por livros poeirentos, que fizera a escolha acertada porque o que conta é o conhecimento amealhado, pese embora o pau analfabeto. Acabadinho de sair da hibernação, de mamar aqui e ali no respeitante a referências, de engordar a cabeça com sofrimento alheio, o cérebro começava a engendrar os seus próprios rastilhos. O resto não conto porque a biografia é minha e aborrece-me inventar. 

Era um tipo assim para o provinciano que, segundo as boas e más línguas, dava mais ares de pastor do que escritor — que culpa tenho eu de ter nascido num século onde ninguém valoriza a patilha — e, para destoar, uma careca em construção.
Cara pouco vendável, um pançudo em formação, menino de uma estupidez sem fim à vista e uns tomates de fazer sombra ao diabo. Dava-me e continua-me a dar um certo gozo alfinetar os bichos (nunca me deu para ser outra coisa senão aquilo que sempre fui), desde borboletas a dragões, bolotas e maçãs míticas, plagiadores a virtuosos, maratonistas e coxos. Antes a escrita encostava-nos à parede, hoje, ao espelho. E eu cagando, nem cabelo tenho.
As voltas que a arte dá, parece um carrossel de trancadas dionisíacas, alguém que aproveite a diversão.
O embotamento do gume do humor, fosse a minha condição financeira digna de inveja e saía já da folha, é merecedora de uma procissão de carpideiras — e vá de choro, vá de choro e vá de choro.

Sejamos ou não amigos, não esperem por mim, não vou ajudar à procissão.
Não sou animal
Que consinta a captura sem dar luta e levar alguns comigo. Se for urgente, procurem-me na secção dos frescos, estarei à vossa espera: com a picha de fora. Consinto que toquem nela para ver se está madura. Não perguntem à senhora da secção se dá para levar metade, ou levam-na toda ou nada feito. Não me tentem com negociatas, nisto — e apenas nisto — sou intransigente.

O homem contemporâneo está imune a tudo o que mexe verdadeiramente, reparem bem na proeza do cabrão: de pé e em coma e já nada o faz abrir a pestana. Num fósforo o novo passa a obsoleto, o genial a mentecapto, deus a mentira — está aqui uma coisa esperta. Careço de feitio para esperar por um milagre, há que trabalhar com o que temos, este magnífico bando de papagaios acéfalos.

Tudo isto ocorreu num estalar de dedos, a magia atrasou-se e o pensamento ficou-lhe com o lugar. Pensamento? Calminha aí nas classificações. Cuidado com essas frases, bramam os autores flácidos. Eles que se fodam mais os outros que dormem de luz acesa com medo do bicho papão do cancelamento.

Nem eu vos entendo, nem vocês a mim: parece que estamos casados há trinta anos. É caso para dizer: o que diria Fernando Pessoa?
Mais uma rodada, uma vez que o imaginei num tasco. Mais um livro. Peço desculpa, só consigo imaginar artistas em tascos a pedir rodadas. Em suma, é a vida e os pormenores do mundo e o seu aeiou. E esses ratos anfíbios, que ora estão aqui, ora estão na cona da mãe, ora estão a masturbar-se com o futuro, ora a escavacar o passado com marretas próprias para pessoas com necessidades especiais, armados em leitores, que nem para limpar o cu pegam num livro; esse nevoeiro de parvoíce com que inundam as caixas de comentários, essa nuvem de dedos em riste com que metralham o singular, essa mistela perfeita de taralhoucos e críticos míopes que sonham opinar sobre a escrita de costas voltadas para as estantes. Não vos consigo levar a sério enquanto confundirem uma palavra nova com D.Sebastião. Estão cansados de esperar? Também eu. Enquanto isso, vão para o caralho.

 

Vacas magras

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2023
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2022
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2021
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2020
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2019
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2018
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2017
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2016
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D

Sigam-me

Partilhem o blog