Roberto Gamito
05.04.21
Alcides, um tipo assim-assim, assim ou assado, notabilizou-se aos olhos dos abutres. Não vos darei um sermão acerca da fanfarronice, porém foi isso que custou a vida ao desgraçado.
Abafaremos as perversidades? Dias de amor, temporadas onde o coração é remunerado principescamente. Em dias de maior penúria, um valha-me Deus cantado num idioma de tristes criaturas.
No pior dos casos, morrem os dois envenenados, no melhor dos casos, apodrece-nos o fígado. Meia dúzia de entendidos em busca da verdade sob estes céus que não lembram a ninguém e estas chuvas de santos incontinentes argumentarão que não foi bem assim que ocorreu.
A história. Uns a embelezá-la, outros a sondá-la, outros ainda a não passar cartão, e vice-versa, visto que o cansaço propicia a troca de cadeiras, embora eu não tenha inclinações nem talento para nada a não ser deixar a banda passar. Às vezes ajeito-me numa patranha miúda, todavia limito-me ao estritamente necessário para a história não morrer. O resto lego aos virtuosos.
Devido à incerteza mórbida da situação, afinal o tipo está vivo ou morto?, compete-me provavelmente continuar a fugir nas linhas ao encontro do âmago do assunto. O que é afinal a vida?
Caso encontrem Alcides noutra história, perdoem-no ou castiguem-no como bem vos aprouver. Contudo lembrem-se: não está fácil para ninguém, mesmo morto é preciso continuar a ganhar para a côdea.
Deve ser óbvio para vocês que o autor destas linhas não testemunhou o episódio que descreveu até este ponto. Em boa verdade, tudo o que vi foram abutres a aproveitar as luzes da ambulância para abanar o esqueleto.